Como o meu amigo Albino Cardoso já assinalou, comemora-se este ano o quinto centenário de boa parte dos forais manuelinos, entre os quais os forais outorgados a Algodres e Matança, no actual concelho de Fornos de Algodres.
O foral de Algodres, de 1514, tem a particularidade de estar associado a uma “trapalhada” na chancelaria de D. Manuel I.
No “Livro dos Forais Novos da Beira” existente na Torre do Tombo, há um primeiro registo do foral dado ao concelho de Algodres, a fls 61v, indicando que o foral foi dado em 20 de Maio de 1514 e que o original tinha 3 folhas. Depois, a fl. 81 do mesmo livro, está lavrado outro registo, com o mesmo título (“forall dado ao concelho dalgodres per el rey dom dinis”), com uma anotação marginal, posta por Fernão de Pina, indicando que foi registado em duplicado, “per erro do escrivam”; este segundo registo contém, porém, algumas diferenças no texto, data também diferente (24 de Março de 1514) e a indicação de que o original tinha 2 folhas. De assinalar que, em ambos os registos, os direitos reais a pagar pelo concelho são fixados em idêntico valor: 11.920 reais, correspondentes a 100 morabitinos de ouro de cinquenta soldos (referentes a rendas), acrescidos de 81 libras e 5 soldos (referentes a colheita), que anteriormente pagavam.
Não se tratando, efectivamente, de uma repetição de registos de idêntico teor, pode-se conjecturar que tenham sido lavrados com base em diferentes minutas (restando saber qual a correspondente ao foral emitido) ou, como já se alvitrou, que os registos se reportem a forais de concelhos distintos, podendo um deles ser relativo ao concelho de Fornos então existente.
A hipótese de um dos registos se reportar a um concelho distinto de Algodres afigura-se, porém, bastante remota. Na verdade, não se conhece outra localidade com esse topónimo que tenha sido concelho e/ou tenha recebido foral de D. Dinis. Quanto a Fornos, teve foral dado por D. Dinis em 1310, que foi objecto de confirmação por D. Manuel I em 1497, mas não é plausível que lhe possa ter sido outorgado um foral novo prevendo o pagamento de direitos reais idênticos aos de Algodres.
Na Idade Média, Algodres era um concelho consideravelmente mais extenso e populoso que o de Fornos, o que se reflectia na importância relativa das respectivas economias e dos tributos a pagar. Nas Inquirições de D. Afonso III, de 1258, consta que Algodres teve uma primeira carta de foro dada por D. Soeiro Mendes e que, por D. Sancho II, a renda foi fixada em 100 morabitinos, pagando ainda de 45 morabitinos de colheita, juntamente com Fornos. No foral dado por D. Dinis a Algodres, em 1311, os direitos reais foram fixados em 250 libras (pelos 100 morabitinos), acrescidos de 81 libras e 5 soldos de colheita (por 32,5 morabitinos que pagavam de colheita - parece ter sido aqui formalizada a separação da colheita paga por Fornos). Relativamente a Fornos, a confirmação, por D. Manuel I, em 1497, do foral de 1310 de D. Dinis, refere que Fornos pagava ao rei 101 libras e 16 soldos. A distinta importância das economias locais é igualmente atestada pelo peso relativo dos rendimentos das igrejas de Algodres e Fornos, como se pode ver, por exemplo, aqui.
Referindo-se, nos forais exarados a fls. 61v e 81 do “Livro de Forais Novos da Beira”, que o concelho devia pagar 11.920 reais, por 100 morabitinos referentes aos direitos reais e rendas e 81 libras e 5 soldos pela colheita, que antes pagavam, estas quantias só podem referir-se a Algodres e não a Fornos.
Assim sendo, ficam por explicar as diferenças de texto, em especial as diferenças de datas e de número de fls., constantes nos registos dos forais atribuídos a Algodres, a fls. fls. 61v e 81 daquele livro.
O exacto teor do foral outorgado a Algodres em 1514, só poderá ser apurado com base noutra fonte, designadamente o original enviado ao concelho ou traslado do mesmo.
Há alguns anos atrás, fui informado, verbalmente, de que o documento em causa não se encontraria no espólio arquivístico da CMFA, o que não será de estranhar, dado que Mons. Pinheiro Marques informa que muita da documentação dos concelhos extintos e integrados no novo concelho de Fornos de Algodres, no séc. XIX, foi então destruída (MARQUES, 1938, pp. 12-13).
Admitindo, em todo o caso, a possibilidade de ter ocorrido alguma descoberta recente, solicitei à CMFA, em 05 de Fev. p.p., informação sobre a eventual existência, no Arquivo Municipal, do original ou transcrição do foral enviado a Algodres em 1514. Não tendo recebido resposta, até esta data, presumo que não terá sido encontrada essa documentação.
Na ausência de outros elementos e a fazer fé em Fernão de Pina, o registo autêntico do foral manuelino de Algodres será o de fls. 61v do “Livro de Forais Novos da Beira”, datado de 20 de Maio de 1514.
No próximo dia 20 de Maio, comemora-se o V Centenário deste marco da história local de Algodres e do actual concelho.
(agradeço aos Drs. Pedro Pinto e José Manuel Vargas as informações prestadas sobre o tema desta entrada)
Bibliografia:
COSTA, Américo, (1929),
Dicionário corográfico de Portugal continental e insular, vol. I, Porto, Livraria Civilização.
DIAS, Luís Fernando de Carvalho, (1961),
Forais manuelinos do reino de Portugal e do Algarve, vol. 1, Beja, ed. do autor.
FRANKLIN, Francisco Nunes, (1825),
Memoria para servir de indice dos foraes das terras do reino de Portugal e seus domínios, Lisboa, Academia Real das Ciências, 2ª. ed..
LIMA, Baptista de, (1932),
Terras portuguesas, vol. I, Póvoa de Varzim, Tip. Camões.
MARQUES, Mons. Pinheiro, (1938),
Terras de Algodres (concelho de Fornos), Lisboa, Câmara Municipal de Fornos de Algodres (com reed. fac-similadas em 1988 e 2001; na reed. de 1988 foi alterada a numeração das págs.).
Portugaliae Monumenta Historica - Inquisitiones, v. 1, pars 2, fasc. 6, Lisboa, Academia das Ciências de Lisboa, 1917, pp. 790-791.
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